Uma
em cada dez crianças e adolescentes sofre com problemas psicológicos suficientemente
graves para afetar seu desenvolvimento e sua vida cotidiana, dos quais a
maioria pode viver normalmente se receberem o tratamento adequado por parte de
pais, professores e profissionais de saúde mental. Entretanto, se estima que
somente 10 % dos menores com problemas recebem o tratamento indicado.
Uma
das causas fundamentais desta situação é a dificuldade dos pais, educadores e médicos
em detectar e atribuir os comportamentos das crianças a ditos transtornos. A
psicoeducação e a sensibilização de pais e educadores contribuem para a
prevenção primária, antes que apareçam os transtornos; a prevenção secundária, referida à detecção
precoce dos transtornos; e a prevenção terciária, a reabilitação do transtorno
quando já está instalado. A psicoeducação contribui para a prevenção dos
transtornos psicológicos já que os adultos sensibilizados detectam os problemas
precocemente e podem agir a tempo.
Os
transtornos mentais são comuns na população em geral, podem padecer deles
pessoas provenientes de todas as classes socioeconômicas, culturais e
educacionais. Podem ser transitórios ou crônicos, leves ou graves. É necessário
identifica-los e oferecer tratamento a tempo já que uma das características
fundamentais dos transtornos é sua associação a outro transtorno, se não é
tratado adequadamente, e sua passagem para a cronicidade quando não são
tratados a tempo.
Um
transtorno mental é um conjunto de sintomas e sinais que configuram uma
síndrome conhecida pelos profissionais de saúde mental. Esta síndrome é
diagnosticada como transtorno quando afeta o funcionamento social, escolar
(laboral) ou familiar e/ou quando causa um mal-estar clinicamente significativo
no sujeito que padece dele ou nas pessoas que lhe rodeiam.
Os
transtornos têm uma gênese multicausal, onde intervêm as características e
conflitos psicológicos do sujeito, a predisposição genética e os acontecimentos
vitais (fator ambiental)
A
prevenção dos transtornos mentais em crianças e adolescentes é direcionada às
características psicológicas dos menores e às condições ambientais, já que nas
predisposições genéticas atualmente não se pode intervir.
As
características psicológicas que podem proteger um menor de padecer de
transtornos mentais são altamente influenciáveis pela educação moral-emocional
no âmbito familiar, escolar e comunitário. Também, as condições ambientais são
determinadas em grande parte pelo clima e a comunicação familiar, escolar e comunitário.
É nestes âmbitos onde costuma intervir os programas preventivos e de promoção
de saúde mental.
Revisão bibliográfica sobre a epidemiologia dos transtornos
mentais e problemas psicológicos em população escolar.
Transtornos disruptivos (conduta)
Calcula-se
que 5,5% das crianças em idade escolar apresentam problemas de comportamento
agressivo. (Hoven et al, 2004 em SIS.Saúde, 2010).
Déficit
de atenção com hiperatividade TDAH 3 – 5% (Hoven et al, 2004 em
SIS.Saúde, 2010)
Transtorno
negativista desafiante Entre 1,7 e 9,9, de acordo a
média sócio-cultural com uma média de 5,7% (WooD, 2000).
Estas crianças
causam sofrimento escolar e familiar. Com freqüência suas condutas são
atribuídas à falta de educação e são catalogados como “mal educados”. A rejeição do meio se converte em um círculo
vicioso que estanca sua readaptação.
Os transtornos
disruptivos aumentam a possibilidade de acidentes e condutas suicidas, terceira
causa de mortalidade em adolescentes.
Transtorno
de conduta dissocial (6-16%) (Wood, 2000).
Muitas vezes, junto com elementos genéticos e
psicossociais, é o resultado da falta de tratamento adequado dos transtornos
disruptivos mencionados acima.
Transtornos afetivos
Transtornos
do estado de ânimo
Estima-se
que 2,5% das crianças e 8,3% dos adolescentes podem sofrer depressão e até 7% desses adolescentes deprimidos podem tentar
autoeliminar-se (Hoven et al, 2004 em SIS.Saúde, 2010). Cada ano se suicida uma média de
2000 adolescentes nos EEUU, ocupando a terceira causa de morte adolescente e se
estima que tentam isso dois milhões, dos
quais só 700.000 recebem atenção sanitária depois da tentativa (Shaffer, 2001).
20 anos atrás
não se aceitava, universalmente, que uma criança pudesse se deprimir. Hoje se
considera uno dos transtornos mais predominantes (KowaTCH, 2000). Apesar de que ambos são
motivos de consultas freqüentes nos centros de saúde por manifestações
somáticas, são raramente detectados por pediatras. São os transtornos menos
reconhecidos pelos adultos. Dificultam o rendimento acadêmico e constituem um
grande sofrimento para os menores. São um fator de risco para o alcoolismo, o
consumo de substâncias e os transtornos da pessoalidade nos adultos
Transtornos
de ansiedade Medos, vergonha excessiva, inquietação.
Aproximadamente
13% das crianças e adolescentes podem sofrer transtornos de ansiedade. (Hoven et al, 2004 em
SIS.Saude, 2010).
Outros problemas de saúde mental
Maltrato (físico- psicológico -negligência)
Abuso sexual. Abuso de drogas. Transtornos de alimentação.
No Brasil destaca-se o estudo de Tabauté (Fleitlich-Bilyk; Goodman, 2004) “A mostra
foi constituída por 1.251 escolares de 7 a 14 anos. Foi utilizado o
Questionário DAWBA para pais, professores e auto-reportes. Se encontrou mais T.
externalizados em meninos que em meninas e se observou um aumento de depressão
com a idade.” (De a Barra, 2009,
p. 307 em Fleitlich-Bilyk, Goodman,
2004).
O
estado de espírito depressivo é uma manifestação afetiva normal. Semelhante aos adultos, as crianças têm dias
os quais se sentem irritadas, de mal- humor, sem motivação ou tristes. Este
estado afetivo negativo, é causado por múltiplos fatores, fisiológicos e
ambientais que não somos capazes de controlar. Poder reconhecê-lo é o primeiro
passo para superá-lo. Ao reconhecer que agimos e pensamos de forma negativa
porque estamos anímicos, delimitamos este mau momento, entendendo que se trata
de algo passageiro, que amanhã estaremos melhor.
Não
podemos manipular diretamente nosso sistema fisiológico, muitas vezes também
não podemos controlar os acontecimentos externos, mas sim podemos manipular
melhor nossos pensamentos e crenças, freqüentemente envoltas nas causas e no
mantimento destes estados negativos. Alguns adultos aprendem a reconhecer seus
estados depressivos. As crianças em crescimento ainda não os podem reconhecer
por si mesmas.
Estes
estados negativos normais duram poucos dias e são leves, já que ainda que
estejamos mal, nos permite pensar positivamente acerca do futuro. Quando estes
estados se prolongam no tempo ou sua intensidade é maior e se pensa de forma
negativa e pessimista acerca do futuro, é possível que estejamos diante de um
problema psicológico; a depressão; se bem que este é um problema comum
na população em geral, não há que deixa-lo passar já que se complica sem
tratamento e gera outros transtornos relacionados, como a ansiedade.
Semelhantes
aos problemas de ansiedade, há 20 anos, a depressão em crianças e adolescentes
era um tema controvertido entre os profissionais da saúde mental. Até então, os
critérios para determinar se uma criança ou adolescente estava deprimido eram
extrapolados dos critérios conhecidos para os adultos. Era difícil que fosse
aceito no âmbito científico que uma criança pudesse ficar deprimida, hoje em
dia são muitas as investigações epidemiológicas que assinalam à depressão como
um dos transtornos psicológicos mais freqüentes nas crianças e adolescentes.
A
que se deve a dificuldade de aceitação da depressão infantil? Deve-se a seu
peculiar modo de manifestar-se; é muito difícil encontrar uma criança que
aceite o angustiante sentimento de tristeza, não é freqüente que uma criança
diga “me sinto triste”.
Uma
criança depressiva se manifesta através de seu comportamento; está irritada,
nada lhe cai bem, se queixa, é difícil de satisfazê-la, chateia-se com
facilidade, se mostra inquieta ou agressiva, com baixo rendimento escolar ou
baixa motivação; ou através de seu corpo, queixa-se de dores infundadas. Hoje em dia,
não é comum que professores e pediatras detectem a depressão, inclusive quando
um grande número de crianças chega ao médico por queixas somáticas, sem causa
orgânica.
As
pesquisas recentes vêm confirmar o que muitos clínicos afirmavam mediante sua
experiência:
As crianças e os adolescentes deprimidos
se manifestam de forma diferente dos adultos. Na atualidade, os estudos
comprovam um consenso na comunidade profissional acerca dos critérios e
diagnósticos da depressão nos menores.
Pelo
seu próprio nível de desenvolvimento emocional, se uma criança está realmente
triste, é difícil que possa reconhecê-lo e menos ainda, expressá-lo em
palavras. A tristeza depressiva é um sentimento tão angustiante, tão inaceitável
e ingovernável para uma criança, que ela tenta afastar-se do mesmo, negando-o.
O
sentimento de tristeza prolongado responde a um estado de espírito interior,
que se manifesta nas crianças e adolescentes mediante a irritabilidade ou
mal-humor, baixa tolerância à frustração, tédio ou perda de prazer em
atividades que antes gostava, baixa motivação, queixas, ou insatisfação. Também,
a criança pode possuir baixa autoestima, manifestada pela crença de não ser
querida pelos demais ou de ser pouco valorizada, de ser menos que os outros ou
de ser tola, feia, e que tudo dá errado. Outras vezes, o que aparece são
sentimentos de culpa. Em casos mais específicos surgem idéias pessimistas sobre
o futuro ou sobre a morte, com um fundo de ansiedade considerável.
Muitas
vezes, estas condutas não são fáceis de detectar pelos pais e educadores, já
que são sintomas de manifestação interna (sentimentos e pensamentos) que as
crianças não costumam compartilhar. Inclusive constituem um desafio para o
psicólogo clínico, já que às vezes, estes sentimentos são manifestados ou se
deixam transparecer por um aparente sentimento contrário: Por exemplo, uma
criança que se mostra com uma autoestima sobrevalorizada (inflada, que tudo
pode) pode ser uma criança que precisa inventar essa fantasia para esconder a
si mesmo, quão pouco se quer quão pouco se valoriza. Por sua vez, uma criança
deprimida pode manifestar-se como uma criança muito alegre, com condutas bobas
e palhaçadas. Estas condutas podem coexistir com momentos em que a criança esteja
alegre e brinca normalmente, mas as condutas inadequadas tendem a ir
aumentando.
Algumas
crianças manifestam condutas agressivas, birras, choram por tudo ou têm um
pranto difícil de acalmar. Pode-se distinguir dois tipos de manifestação e
todos suas matizes intermediárias. As
crianças deprimidas que baixam seu nível de atividade, com grande carga de
sentimentos e pensamentos depressivos, que não manifestam. E as crianças
deprimidas que se manifestam com problemas de conduta, birras. Estas últimas são
conhecidas como “crianças explosivas”, por seu alto nível de irritabilidade, e
pobre controle emocional. Em momentos críticos, ambos baixam seu rendimento
escolar, sendo este feito o que muitas vezes desencadeia as chamadas de atenção
do professor e a consulta dos pais ao psicólogo.
Mas
se sua manifestação mascarada e seus critérios diagnósticos comprovados muito
recentemente dificultam a detecção precoce por parte de pais, professores e
pediatras, há um elemento central que dificulta em grande parte seu reconhecimento:
A nós adultos nos angustia em demasiado
aceitar que nossos filhos possam estar sofrendo sentimentos depressivos.
3.
Hiperatividade e desatenção
Mais de uma de cada 30 pessoas (5%) sofrem com o transtorno por déficit de
atenção com ou sem hiperatividade. Este transtorno está caracterizado por um
desnível na capacidade de atenção e regulação motora; que lhes causa
dificuldades para manter a atenção constante numa tarefa prolongada, como assistir
às aulas, fazer as tarefas ou ao ter que escutar aos adultos.
Freqüentemente
estas crianças se esquecem de suas coisas, dirigem a atenção para outras
atividades antes de terminar una tarefa ou têm dificuldade para permanecer
sentado.Há crianças predominantemente desatentas, que não manifestam
hiperatividade e os que são predominantemente hiperativos.
A
falta de regulação da atividade motora (hiperatividade) se relacionada com a
dificuldade de pensar antes de agir: Impulsividade.
Condutas impulsivas, como
atravessar a rua sem olhar para os lados, responder antes de que se termine de
perguntar, não esperar pela sua vez, bater em seus companheiros quando o que
quer é brincar e outras condutas de risco nas que parece não medir o perigo. Esta
síndrome é conhecida como transtorno por déficit de atenção com ou sem
hiperatividade e padecem dela uma grande porcentagem de crianças e
adolescentes.
Estas
crianças eram antes tidas como malcriadas, brigonas, baderneiras, inclusive
hoje antes de serem diagnosticadas são consideradas com estas qualificações já
que seu comportamento é bastante irritante em casa e na escola. As crianças
predominantemente desatentas passam a imagem de crianças um tanto quanto tolas,
entretanto seu problema nada tem a ver com falta de inteligência.
Não
se informou adequadamente aos pais, professores e pediatras sobre a detecção
precoce desta síndrome, pelo que atribuem sua conduta ao seu caráter, à má
intenção da criança: É comum culpar aos pais pela má educação e falta de
limites. Os pais se sentem angustiados e culpados, fizeram tudo o que foi
possível, experimentaram diferentes métodos e nada pareceu funcionar. As
professoras se sentem muitas vezes frustradas com crianças que parecem não
estarem interessadas, que não seguem as instruções e que bagunçam a classe.
As
crianças constroem sua identidade e sua autoestima a partir do que lhes
refletem os demais sobre elas mesmas. A criança com dificuldades deste tipo,
recebe do meio uma imagem negativa, ele mesmo se considera mau, ao mesmo tempo
que descobre que isso lhe traz também alguns benefícios, como o medo de seus
companheiros ou seus risos quando adota o papel de palhaço.
É
importante diferenciar a agressividade (intenção de fazer dano) da
impulsividade (dificuldade em controlar seus impulsos). Sua impulsividade as
faz estarem sempre metidas em confusões e brigas. Muitas crianças impulsivas
são catalogadas como agressivas, causando-lhes dessa forma um dano considerável
a sua personalidade. Se não são compreendidas, estas crianças terminarão sendo
realmente agressivas pelos recorrentes ataques que recebem e por sua
identificação com o papel de malvado marcado pelos adultos.
Estes
menores costumam serem inteligentes e criativos. Entretanto muitas vezes
fracassam na escola. O prognóstico sem tratamento não é bom, deriva em
transtornos de conduta, transtornos depressivos e consumo de substâncias. Com
tratamento, no qual participam pais e professores, existe melhora,
principalmente quanto aos sintomas associados, ao passo que melhora a qualidade
da vida familiar.
Comorbidade
A
comorbidade se dá por outros transtornos que coexistem com o TDAH ou que são
provocados por este na evolução do mesmo. Os transtornos associados pioram
dramaticamente o prognóstico, por isso tem que se enfrentar os elementos
predisponentes: Desmoralização (a criança sofre rejeição de seus companheiros e
seus fracassos acadêmicos e sociais, baixa autoestima, construção de identidade
negativa ou instável (“sou mau”, palhaço), aparecimento de mentiras e enganos,
elementos de insegurança e ansiedade e crise no funcionamento familiar.
Tábua I Comorbidade do
TDAH
60%
|
Transtorno negativista-desafiante
|
20 – 40 %
|
Transtorno de conduta dissocial
|
20 %
|
Ansiedade ou depressão
|
Tratamento multimodal
Existe consenso entre os profissionais da
saúde mental sobre o tripé terapêutico:
1.
Tratamento
psicológico
2. Psicoeducação
(informação à criança, aos pais e ao professor sobre as características do
transtorno e pautas educativas específicas)
3.
Psicofármacos
A
combinação entre tratamento psicológico cognitivo-comportamental e medicação
tem dado os melhores resultados. Quando a criança manifesta problemas
acadêmicos devido ao transtorno, é indicada a reeducação psicopedagógica.
Tanto
a criança quanto a família devem atribuir as melhorias não só à medicação mas
também a outros fatores sobre seu controle; estratégias psicológicas de
controle (família) e de autocontrole (criança). Quando os objetivos
psicoterapêuticos vão sendo cumpridos o psiquiatra responsável pelo tratamento
decidirá se a medicação deve ser progressivamente diminuída.
Tratamento
psicológico
1. Programas
terapêuticos em grupo.
Os
avanços no conhecimento do transtorno, suas características cognitivas e
emocionais específicas fizeram proliferar os programas terapêuticos grupais
dirigidos a melhorar a atenção, o
controle de impulsos e a capacidade de tolerar as frustrações. Assim
como, promover o autocontrole emocional, a autoestima equilibrada, as condutas
pró-sociais, as habilidades sociais e de resolução de conflitos interpessoais.
Destacam-se os cursos de habilidades sociais e a
terapia através do esporte. Este último conta com a vantagem de se realizar num
meio natural (grupo de crianças) e estimulante (a prática esportiva).
2. Treinamento
para pais em habilidades educativas.
Enquanto que a educação e o clima familiar são um
dos principais fatores de proteção contra os transtornos mentais, todos os pais
deveriam aprender técnicas educativas saudáveis para a educação de seus filhos,
que os façam sentir-se seguros e eficazes em sua função educativa.
Mais ainda, os pais de crianças com TDAH que
apresentam dificuldades específicas na aprendizagem moral-emocional. Moral
(interiorização de normas de relação interpessoal, o que se pode fazer e o que
não) Emocional (dificuldade em reconhecer e expressar adequadamente seus
sentimentos).
3. Psicoterapia
individual para a criança e sua família.
A psicoterapia é uma disciplina científica e
tratamento psicológico por excelência. Apoiada pela OMS, é indicada para tratar
o sofrimento psíquico. É o tratamento de primeira ordem quando existem
transtornos ou problemas afetivos (ansiedade – depressão), ou de conduta. Tem a
vantagem de personalizar e aprofundar-se em cada caso, como único e
irrepetível.
O psicoterapeuta
(professional da saúde especificamente formado em psicoterapia) com uma
perspectiva integradora, atua como treinador pessoal (sistema de coaching) da
criança para acompanhá-la, motivá-la e orientá-la a enfrentar suas dificuldades
de forma criativa e saudável, construindo estratégias (“truques”) de
autocontrole. Também, o psicoterapeuta desenha junto aos pais um plano de ação
específico para a criança e supervisiona sua aplicação em casa e na escola.
Ainda que tenha perdido espaço para as medicações e
os programas grupais (que estiveram no auge na última década), consideramos que
a psicoterapia individual cognitiva-comportamental (com os pais como
coterapeutas em casa) deve voltar a assumir o papel protagônico no tratamento
psicológico da criança e do adolescente com TDAH, complementada com os
programas terapêuticos grupais, o treinamento dos pais, a reeducação
psicopedagógica se necessária e a medicação se necessária.
Veja no final da página Dicas de este blog, articulo sobre tratamento de TDAH em adultos
A
ansiedade é um mecanismo psicológico que, na sua medida adequada, funciona como
sistema de alarme dando à criança a precaução ajustada a situações de potencial
perigo. Certo grau de ansiedade controlada é funcional e esperada. Entretanto,
num grande número de crianças e adolescentes, a ansiedade responde de forma
exagerada. A função de alerta transborda, causando sofrimento interno, podendo
afetar a saúde física, a adaptação social e o rendimento acadêmico do menor.
A
ansiedade manifesta-se através:
- Do pensamento; com medos ou preocupações excessivas, imposição de imagens angustiantes.
- Do corpo; com sudorese, tensão muscular, dores abdominais ou cefaléias.
- Do comportamento; inquietação, evitar as situações temidas, timidez.
Pode
afetar a conciliação do sono ou interrompê-lo com pesadelos ou sonhos de
angustia (a criança acorda sobressaltada sem lembrar o que foi sonhado).
No
primeiro ano aparecem os medos relacionados com ruídos fortes ou pessoas
estranhas. Nos pré-escolares é comum o temor à separação dos pais, aos animais,
à escuridão, às tempestades, aos seres fantásticos como bruxas ou fantasmas.
O
início da idade escolar (6-12 anos) está marcado pelos temores sociais, teme
passar-se por ridículo diante dos seus, o baixo rendimento escolar, o dano
físico e as desavenças entre os pais. Na puberdade podem surgir preocupações
referentes a doenças e acidentes. Na adolescência predominam os medos que têm a
ver com as relações interpessoais e a perda da autoestima (a angústia que faz
com que se sintam inferiores aos outros).
Quando
os medos e preocupações são produzidos com maior freqüência ou maior
intensidade ou causam sofrimento à criança ou alteram suas atividades sociais
ou acadêmicas, podemos falar de um possível transtorno de ansiedade.
Muitas
vezes, considera-se que os menores deveriam se sobrepor aos sintomas usando tão
somente a força de vontade, no entanto isto não é possível sem tratamento.
Os
pesadelos repetitivos, os sonhos de angústia, as queixas sobre dores ou a inquietação
ansiosa podem estar evidenciando que a criança está sofrendo uma ansiedade
excessiva. Se estes sintomas se prolongam é preciso consultar o especialista.
As fobias são medos excessivos a objetos
ou situações que causam comportamentos de evitação. A pessoa evita o objeto (ex. animais) ou
situações (ex. falar perante um grupo de pessoas). As fobias são medos
patológicos.
Um
dos transtornos de ansiedade de maior freqüência em crianças e adolescentes é a
ansiedade generalizada (AG). Estas crianças sofrem por estarem continuamente
preocupadas com coisas ruins que lhes
possam ocorrer. É caracterizado por pensamentos denominados catastróficos, como possíveis doenças dos pais ou outros familiares,
acidentes ou mortes. Por sua vez, qualquer fato do cotidiano pode ser fonte de
preocupação, relações com os amigos, rendimento escolar ou esportivo.
Estas
crianças não costumam manifestar suas preocupações, já que uma parte sã delas
pode admitir que são assuntos sem importância real (bobagens) e que não querem
colocar-se em evidência ao expressá-los. Contudo a preocupação não cessa.
É
difícil, para pais e professores detectar um menor com AG já que muitos deles
(não todos) são vistos aos olhos dos adultos como crianças obedientes e
estudiosas (às vezes perfeitas). Costumam chegar ao especialista depois de
queixas somáticas, dores abdominais ou cefaléias sem causa orgânica, ou um
estado avançado de transtorno, o qual começa a interferir
na vida social ou acadêmica, ou a causa da depressão vinculada freqüentemente à AG sem tratamento.
As
crianças afetadas pelo transtorno de ansiedade por separação, sofrem um
mal-estar excessivo quando ocorre ou se antecipa uma separação a respeito do
lar ou de algumas das figuras significativas (pais, irmãos, avós). Preocupam-se
com a possibilidade de que as figuras significativas sofram algum dano, sofram
algum acidente ou que sejam seqüestrados.
Podem
resistir ir à escola, a festas infantis ou dormir fora de casa, por não querer
separar-se de seus pais. Podem ter pesadelos recorrentes com a temática da
separação. Quando ocorre ou é antecipada a separação (ex. ir à escola) se
queixam de dores assintomáticas (cefaléias, náuseas, vômitos, dores
abdominais).
O
Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC), é um transtorno de ansiedade, o 4º mais freqüente,
podendo alcançar 5% da população geral. O TOC se configura pela presença de
obsessões e/ou compulsões repetidas que causam um grande sofrimento e interfere
na vida social e acadêmica do menor que dele padece.
As
obsessões são idéias ou pensamentos desagradáveis e repetitivos. Manifestam-se
insistentemente, de forma incontrolável, causando uma preocupação e mal-estar
persistente e um alto nível de ansiedade. As compulsões são comportamentos que
a criança realiza repetidamente para aliviar a ansiedade.
Fran, de 09 anos, estava sentado em silêncio em sua
carteira ao fundo da sala apagando a última palavra
que havia escrito. Devia ter
muito cuidado porque já havia apagado essa palavra tantas vezes que o papel começava a
rasgar-se. Gostaria de ter pedido uma folha nova a professora, mas não se
atrevia. Olhou ao redor aos demais alunos e percebeu que quase todos haviam terminado o trabalho. Ele se
quer havia escrito duas linhas
completas! Fran começou a ficar preocupado. Sabia que muito em breve a tia lhes pediria que entregassem os
trabalhos e, outra vez, teria problemas
por não havê-lo terminado.
Permaneceu
sentado sentindo-se lento e estúpido e, sobretudo, triste. Sabia por que
apagava tanto. Não o fazia porque quisesse, mas porque sentia que devia
fazê-lo. Por causa do TOC que padecia, Fran queria fazer tudo com perfeição.
É
claro que a outra parte do Fran não afetada pelo TOC sabia que, por mais que
tentasse, não podia ser perfeito todo o tempo. Mas a parte afetada pelo TOC
sempre estava preocupada em fazer tudo com perfeição. Por exemplo, a palavra
que escrevia. Não era nada do outro mundo, só uma palavra. Mas não conseguia
fazer o “a” de forma que ficasse bem alinhado, por isso que apagava uma ou outra
vez. Como podia explicar-lhe seus sentimentos à tia para que o entendesse? De
repente, a professora aproximou-se da sua mesa e recolheu o seu papel.
—Vejo
que hoje também não terminou seu trabalho, Fran –disse ela balançando a cabeça.
À
tarde, ao terminarem as aulas, a tia Chamou o Fran.
—
Tenho um recado para sua mãe. Entregue-o a ela, por favor.
Durante
todo o caminho de volta ia se perguntando o que tinha escrito no recado.
Estava
nervoso porque, pela olhada que fez a tia quando lhe entregou o recado, estava
certo de que não seriam boas notícias. Quando Fran chegou em casa, doía-lhe o
estômago.
—
“Tô” em casa – gritou, deixando sua mochila e correndo para acima para o seu
quarto.
Sua
mãe o encontrou pouco despois enrolado em sua cama.
—
Um mal dia, querido? – perguntou-lhe tirando o cabelo grosso e escuro dos
olhos.
—
A tia te enviou um recado, mamãe – disse Fran–. Creio que meti os pés pelas
mãos outra vez – murmurou com tristeza.
Sua
mãe saiu do quarto e retornou pouco depois com a carta na mão. Sentando-se ao
lado de Fran na cama e lhe disse:
—
Por que não a lemos juntos? “Querida Sra. Fernandez, Fran não faz os trabalhos
de classe. Embora ele seja muito inteligente, não tenta fazê-los. É preciso que
fale a senhora com ele”.
Dobrando
a carta sua mãe disse:
—
Bem Fran, acredita que não faz os trabalhos por preguiça?
—
Não mamãe –respondeu Fran–. Eu tento de verdade, mas às vezes as coisas não
saem como quero. Como hoje, que fiquei enganchado em una palavra estúpida só
porque não me saía uma das letras.
Sua
mãe passou um braço pelos seus ombros:
—
Não acredita que já está na hora de contar a tia sobre o TOC e como isso te faz
agir às vezes?
Fran
murmurou:
—
Não queria que ela soubesse, mãe, não quero ser diferente dos outros.
Sua
mãe lhe respondeu:
—
Sabe de uma coisa, Fran? Você é diferente dos outros. O TOC é só uma pequena
parte dessa diferença, porque só é uma pequena parte de ti como pessoa. Creio
que já é hora de ajudar à tia a entender o que se passa com você. O que você
acha?
No
dia seguinte, antes de começar a aula, Fran e sua mãe foram ver a tia. Fran lhe
disse que estava fazendo um tratamento para TOC, e teve que explica-lo a sua
professora. Que nervoso estava! Explicou à tia por que não pode acabar o
trabalho escrito do dia anterior. Depois, suspirou fundo e lhe falou sobre
outras vezes em que ficou preocupado e ansioso na escola. Contou-lhe coisas
como que, às vezes, sem importar quanto tempo tivesse que passar no banheiro,
não se atrevia a sair para o corredor até que visse passar outro menino.
Explicou-lhe que, embora SOUBESSE que era bobagem, a parte do TOC de sua pessoa
lhe fazia sentir que havia algo mau no corredor que podia lhe “agarrar”.
—
Me preocupo muito –disse Fran a sua professora, com as palavras saindo aos
garranchos–, mas tento fazer com que não me note. A tia lhe respondeu:
—
Fran, você é um dos alunos mais inteligentes que tenho. Me alegro muito de que
me explique isto sobre o seu TOC; assim agora posso entender por que tem tido
problemas com seus trabalhos. Tu, tua mãe e eu formamos uma equipe e todos
temos que colaborar para que possa sentir-se bem na escola. Agora, falemos
sobre o que podemos fazer em sala para te ajudar quando o TOC te bloqueia e
para que não te sinta frustrado.
Esta história reflete a realidade de poucas crianças,
a maioria dos afetados, não sabe que sofrem um transtorno, se creem tolos ou
“medrosos” ou que vão enlouquecer. Também não o sabem pais e professores, o que
faz com a criança tenha que enfrentar situações humilhantes, afetando sua
autoestima e seu desenvolvimento.
A propósito de em
estudo retrospectivo de adultos com TOC
Constance H. Foster (2000) relata que:
•
“Durante os anos de crescimento, para 80% dos adultos com TOC foi difícil
explicar seus sintomas aos outros. A vergonha, a falta de conhecimento sobre o
transtorno e o temor de não serem compreendidos foram os motivos mais citados
para permanecerem em silêncio.
•
As pessoas que responderam à pesquisa indicaram que não contaram a ninguém
sobre seus sintomas obsessivos e compulsivos até depois de 20 anos em media.
•
Quando perguntados sobre o que teria ajudado a preencher a falta de tratamento,
as duas respostas mais frequentes dos participantes na pesquisa foram um
diagnóstico mais precoce (27%) e um tratamento mais precoce (24%).
Os
próprios pacientes com TOC testemunham à necessidade de uma maior compreensão
do seu problema.
•
A maioria das pessoas que responderam à pesquisa disse que o TOC influenciou de
forma negativa sobre os seguintes aspectos em seus anos de desenvolvimento:
disfrutar a infância (81%), relação com seus pais (63%), rendimento escolar
(58%), participação em atividades (56%) e capacidade de fazer e manter amigos
(55%).”
Relatos de crianças
diagnosticadas com TOC [3]
“
Só quando tinha 5 ou 6 anos foi que percebi pela primeira vez. Mantive isso em
segredo o tempo que pude”.
Carlos, 14 anos
“Foi
um grande alívio sabê-lo [que tinha TOC]. Pensava que estava realmente louco,
ou que algo não funcionava bem dentro de mim”.
Oscar, 12 anos
“Quando
me disseram que isso também acontecia com outras pessoas não podia crer!”
Carmen, 11 anos
“Os
pais não costumam pensar que seu filho sofre um transtorno psicológico: tendem
a considerar que só são “coisas de crianças” ou raridades que irão passando com
a idade. Alguns repreendem o menino e, outros, se tornam cúmplices. Quando o
certo é que, se não é tratado o transtorno, a frequência e intensidade das
obsessões e as compulsões da criança geralmente irão aumentando e a doença se
agravará.” (Foster, 2000)
Se
a criança sofre com algum medo ou preocupação excessiva é fundamental não negar
seus sentimentos. Ainda que sejam fantasias ou pareçam bobagens, existe na
mente da criança e isso a afeta de forma real. Utilize a escuta ativa. Para
transmitir-lhe tranquilidade e segurança não é necessário negar aquilo que a
criança está sentindo. É importante acompanhá-lo dando-lhe estratégias de
enfrentamento e confiança de que ele poderá superar os medos, pouco a pouco.
Devido
que na etiologia dos transtornos de ansiedade os fatores genéticos e o clima de
apreensão familiar são freqüentes Se seu filho tem medos ou preocupações,
revise seus próprios medos como pai ou mãe e tente passar confiança à criança
para seu crescimento. Não permita que a criança evite por muito tempo situações
de medo, do contrário o medo aumentará. Se os medos e as preocupações se
prolongam consulte um especialista.
O diagnóstico de transtorno de ansiedade
produz um grande alívio às crianças e adolescentes que padecem dele já que
compreendem que seus pensamentos (exagerados, tolos ou desagradáveis) não são
produto da loucura, nem de uma fraqueza de caráter, mas de um transtorno que
padecem muitas crianças e adolescentes como ele, que tem cura e logo será
ajudado.